Seg, 06 de junho de 2011
Em novembro de 2008, o oncologista Gero Hütter, da Clinica Charité de Berlim, conseguiu curar o americano Timothy Ray Brown, que sofria de aids e leucemia, através de um transplante de medula.
Hütter, de 43 anos, recebeu no ano passado o prêmio da AIDS Policy Project de São Francisco pela "primeira cura funcional da aids". Leia a seguir na íntegra a entrevista feita pela jornalista Graça Magalhães-Ruether:
O Globo: Como foi possível a cura do paciente?
GERO HÜTTER: Em 2006, fomos procurados por um americano que sofria de aids e leucemia. Nessa época, nós já sabíamos que de 1% a 3% dos europeus têm uma proteção natural contra a infecção com o vírus HIV (asiáticos e africanos não apresentam) porque têm uma mutação genética, provavelmente oriunda de uma epidemia viral ocorrida no continente há cerca de mil anos. Trata-se da mutação chamada delta 32. Na busca de um doador de medula para o nosso paciente, encontramos um que tinha a alteração genética. Fizemos o transplante. Ele foi também submetido a quimioterapia e radioterapia para destruir o maior número possível das suas células doentes. Meses depois do transplante, ele tinha ainda algumas células infectadas com o HIV. Depois de dois anos, constatamos que todas as células sanguíneas do paciente tinham sido substituídas pelas do doador. O paciente estava curado. Ainda hoje ele continua livre do vírus HIV.
O Globo: Por que o senhor não usou a mesma terapia com outros portadores do HIV?
HÜTTER: Um transplante de medula é uma operação de alto risco e só aconselhada quando o doente sofre também de leucemia e tem o diagnóstico de que morreria sem a cirurgia. Com base nisso, tentamos uma operação de transplante de células-tronco, mas sem o mesmo sucesso. É difícil encontrar um doador com o mesmo defeito genético. Em dois casos, conseguimos um doador, mas a operação não foi bem sucedida. Eu diria que o método não pode ser usado como uma terapia geral contra a aids, mas abre caminho para o desenvolvimento da terapia genética, como vem sendo pesquisada na Alemanha e nos Estados Unidos.
O Globo: Cientistas canadenses narraram também o caso de prostitutas africanas que têm contato com portadores do vírus mas não adoecem. Como o senhor explica?
HÜTTER: Trata-se de uma outra forma de proteção natural mas que não está relacionada com a mutação genética que abordei antes. O provável é que essas mulheres, do Quênia, tenham uma mistura de proteína antiviral que faz com que não adquiram a doença.
O Globo: Qual é a maior dificuldade de se ter uma terapia que efetivamente cure a doença?
HÜTTER: O grande problema da eliminação (total) do HIV são os reservatórios, partes do organismo onde o vírus é preservado e volta a se multiplicar depois de tentativas de terapia. Um passo importante para a terapia seria um meio de atacar esses reservatórios.
O Globo: Com o transplante não foi possível "esvaziar" também os reservatórios?
HÜTTER: Foi. O americano, que voltou para os Estados Unidos e vive hoje em São Francisco, teve o vírus eliminado também nos reservatórios. O problema é, como já disse, que não temos ainda um meio de usar o método em série. Desde que o caso foi divulgado, recebemos a procura de centenas de pessoas do mundo inteiro, que se ofereceram para participar da pesquisa. Nós continuamos com o nosso trabalho e oferecemos o exame de identificação do defeito genético protetor contra o vírus até de graça. É claro que espero um dia repetir com êxito a terapia.
Hütter, de 43 anos, recebeu no ano passado o prêmio da AIDS Policy Project de São Francisco pela "primeira cura funcional da aids". Leia a seguir na íntegra a entrevista feita pela jornalista Graça Magalhães-Ruether:
O Globo: Como foi possível a cura do paciente?
GERO HÜTTER: Em 2006, fomos procurados por um americano que sofria de aids e leucemia. Nessa época, nós já sabíamos que de 1% a 3% dos europeus têm uma proteção natural contra a infecção com o vírus HIV (asiáticos e africanos não apresentam) porque têm uma mutação genética, provavelmente oriunda de uma epidemia viral ocorrida no continente há cerca de mil anos. Trata-se da mutação chamada delta 32. Na busca de um doador de medula para o nosso paciente, encontramos um que tinha a alteração genética. Fizemos o transplante. Ele foi também submetido a quimioterapia e radioterapia para destruir o maior número possível das suas células doentes. Meses depois do transplante, ele tinha ainda algumas células infectadas com o HIV. Depois de dois anos, constatamos que todas as células sanguíneas do paciente tinham sido substituídas pelas do doador. O paciente estava curado. Ainda hoje ele continua livre do vírus HIV.
O Globo: Por que o senhor não usou a mesma terapia com outros portadores do HIV?
HÜTTER: Um transplante de medula é uma operação de alto risco e só aconselhada quando o doente sofre também de leucemia e tem o diagnóstico de que morreria sem a cirurgia. Com base nisso, tentamos uma operação de transplante de células-tronco, mas sem o mesmo sucesso. É difícil encontrar um doador com o mesmo defeito genético. Em dois casos, conseguimos um doador, mas a operação não foi bem sucedida. Eu diria que o método não pode ser usado como uma terapia geral contra a aids, mas abre caminho para o desenvolvimento da terapia genética, como vem sendo pesquisada na Alemanha e nos Estados Unidos.
O Globo: Cientistas canadenses narraram também o caso de prostitutas africanas que têm contato com portadores do vírus mas não adoecem. Como o senhor explica?
HÜTTER: Trata-se de uma outra forma de proteção natural mas que não está relacionada com a mutação genética que abordei antes. O provável é que essas mulheres, do Quênia, tenham uma mistura de proteína antiviral que faz com que não adquiram a doença.
O Globo: Qual é a maior dificuldade de se ter uma terapia que efetivamente cure a doença?
HÜTTER: O grande problema da eliminação (total) do HIV são os reservatórios, partes do organismo onde o vírus é preservado e volta a se multiplicar depois de tentativas de terapia. Um passo importante para a terapia seria um meio de atacar esses reservatórios.
O Globo: Com o transplante não foi possível "esvaziar" também os reservatórios?
HÜTTER: Foi. O americano, que voltou para os Estados Unidos e vive hoje em São Francisco, teve o vírus eliminado também nos reservatórios. O problema é, como já disse, que não temos ainda um meio de usar o método em série. Desde que o caso foi divulgado, recebemos a procura de centenas de pessoas do mundo inteiro, que se ofereceram para participar da pesquisa. Nós continuamos com o nosso trabalho e oferecemos o exame de identificação do defeito genético protetor contra o vírus até de graça. É claro que espero um dia repetir com êxito a terapia.
Fonte: Agência Aids
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